Aluá, mungunzá e a bença de São Marçá
Por onde andará o aluá? Tenho me batido por estes terreiros, atrás de um bom vinho e não tenho encontrado. O aluá, que aqui entre nós é uma bebida feita com a casca do abacaxi, já fez e aconteceu na quadra junina. Tinha presença certa no arraiá, junto com o mingau de milho, com o bolo de macaxeira e a canjica.
Era respeitado. Em alguns casos, na falta da geladeira (noutros tempos não era qualquer pessoa que tinha a sua Gelomatic), havia o cuidado de acondicionar o suco em potes de barro ou bilhas, para conservá-lo geladinho. Ficava que era uma maravilha.
Hoje em dia, anda meio démodé, o aluá. Nem citado é nos roteiros culinários da ocasião.
Um exemplo disso é que num programa de TV, dei com uma especialista recomendando as comidas típicas de junho e integrando, surpreendentemente, ao nosso cardápio, o despropositado quentão. Ora quentão!
Eu sempre ouvi falar de quentão. Mas aqui em Belém, já com alguns anarriês no costado, já tendo saltado alguns formigueiros e me escabriado umas quantas vezes da chuva de mentira e da chuva de verdade, não lembro de ter tomado um tiquinho sequer desta bebida. Por isso, duvido que a tal recomendação tenha sido de vera (acho que essas referências controversas são ainda, heranças daqueles livros de Integração Social, que desconsideravam os considerandos regionais: integravam por demais). Se fosse o aluá, ainda vá, mas quentão! Aqui em Belém, quentão, só se for gelado, advertiu o meu compadre Edir Gaya, quando veio tomar um mungunzá aqui em casa, no aniversário da afilhada Amaranta Maria.
O quentão, o nome já tá dizendo: é uma bebida quente. E não é quentinha não. É uma cachaça aquecida a altas temperaturas e apurada com alguns temperos como o gengibre por exemplo. Tomei quentão, uma vez, num arraial tradicional em Rondônia, e me fiz de macho, porque o bicho é forte. Na primeira golada as lágrimas desceram dos’óio. Mas tive motivo para a audácia: por esta época do ano, a temperatura em Porto Velho beira os 15 graus. Então, com toda derrota, aquele caldo apimentado caía até bem para dar um calor à alma. Aqui em Belém se o camarada for tomar quentão, depois de marcar uma parte de forró com a cabrocha, ele estopora. Solta fumaça pelos ouvidos e fica só o endereço. Só a casqueta.
E por falar em casqueta, a gente já está na batida da campa das festas joaninas. O final de semana ainda nos traz boas e elegantes exibições de quadrilhas, pássaros, bois (amanhã a terra vai tremer com a despedida do Pavulagem), mas os folguedos já se despedem. A cultura brasileira, no geral, e a paraense, em particular, ascendem aos píncaros com as manifestações folclóricas que se realizam em junho. As tradicionais homenagens aos santos, as simpatias, as danças, as relações de compadrio firmadas à luz da fogueira, consagram e certificam a ‘cultura popular’ verdadeiramente como cultura e inegavelmente como popular (tenho só alguns poréns quanto a incorporação de certos ritmos e aos movimentos contínuos e excitados que os cavalheiros fazem nos passos da ‘quadrilha moderna’, mas nada que fira o zelo e a simetria das prodigiosas coreografias. Não é por nada, não, é porque eu sou da antiga mesmo, do tempo do balancê nos seus devidos lugares).
Agora, tirando da grande roda a incompatibilidade entre as propriedades do quentão e as do antigo aluá, passamos um aperreio danado no último dia 30, para acender uma fogueira. É que tá difícil achar paneiro hoje em dia, na cidade, e queimar saquinho plástico não tem combina, além do que, São Marçá é bem capaz de ralhá.
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